quinta-feira, 27 de março de 2014

uma colaboração inusitada de um familiar de paciente

Marcio França Oliveira enviou por e-mail:
"Quando li o texto a seguir a carapuça entrou.
Mas também me lembrei de alguém que iria se divertir com o texto.
Bj."


MELHOR IDADE É A PQP (Ruy Castro*) 

Prezados companheiros (as) da melhor idade.
O tamanho da letra já é para facilitar a vida de alguns.
O bem humorado e realista texto do Jornalista Ruy Castro está ótimo.
Divirtam-se.

 "Prazeres da melhor idade"

Melhor idade é a puta que te pariu - a melhor idade é de 18 aos 40 anos...
   
A voz em Congonhas anunciou: "Clientes com necessidades especiais, crianças de colo, melhor idade, gestantes e portadores do cartão tal terão preferência etc.". Num rápido exercício intelectual, concluí que, não tendo necessidades especiais, nem sendo criança de colo, gestante ou portador do dito cartão, só me restava a "melhor idade" - algo entre os 60 anos e a proximidade da morte.

Para os que ainda não chegaram a ela, "melhor idade" é quando você pensa duas vezes antes de se abaixar para pegar o lápis que deixou cair e, se ninguém estiver olhando, chuta-o para debaixo da mesa. Ou, tendo atravessado a rua fora da faixa, arrepende-se no meio do caminho porque o sinal abriu e agora terá de correr para salvar a sua vida. Ou quando o singelo ato de dar o laço no pé esquerdo do sapato equivale, segundo o João Ubaldo Ribeiro, a uma modalidade olímpica.

Privilégios da "melhor idade" são o ressecamento da pele, a osteoporose, as placas de gordura no coração, a pressão lembrando placar de basquete americano, a falência dos neurônios, as baixas de visão e audição, a falta de ar, a queda de cabelo, a tendência à obesidade e as disfunções sexuais. Ou seja, nós, da "melhor idade", estamos com tudo, e os demais podem ir lamber sabão.

Outra característica da "melhor idade" é a disponibilidade de seus membros para tomar as montanhas de Rivotril, Lexotan e Frontal que seus médicos lhes receitam e depois não conseguem retirar.

Outro dia, bem cedo, um jovem casal cruzou comigo no Leblon. Talvez vendo em mim um pterodáctilo da clássica boemia carioca, o rapaz perguntou: "Voltando da farra, Ruy?". Respondi, eufórico: "Que nada! Estou voltando da farmácia!". E esta, de fato, é uma grande vantagem da "melhor idade": você extrai prazer de qualquer lugar a que ainda consiga ir.

Primeiro, a aposentadoria é pouca, quase uma esmola, e você tem que continuar a trabalhar para melhorar as coisas. Depois vem a condução.
Você fica exposto no ponto do ônibus com o braço levantado esperando que algum motorista de ônibus te veja e por caridade pare o veículo e espere pacientemente você subir antes de arrancar com a rapidez como costumam fazer.

No outro dia entrei no ônibus e fui dizendo:
- "Sou deficiente".
O motorista me olhou de cima em baixo e perguntou:
- "Que deficiência você tem?"
- "Sou broxa!"
Ele deu uma gargalhada e eu entrei.

Logo apareceu alguém para me indicar um remédio. Algumas mulheres curiosas ficaram me olhando e rindo...
Eu disse bem baixinho para uma delas:
- Uma mentirinha que me economizou R$ 3,00, não fica triste não, foi só para viajar de graça.

Bem... fui até a pedra do Arpoador ver o por do sol.
Subi na pedra e pensei em cumprir o ritual que costuma ser feito pelos mais jovens no local. Logicamente velho tem mais dificuldade. Querem saber?
Primeiro, tem sempre alguém que quer te ajudar a subir: "Dá a mão aqui, senhor!!!"
Hum, dá a mão é o cacete, penso, mas o que sai é um risinho meio sem graça.

Sentar na pedra e olhar a paisagem era tudo o que eu queria naquele momento.
É, mas a pedra é dura e velho já perdeu a bunda e quando senta sente os ossos em cima da pedra, o que me faz ter que trocar de posição a toda hora.

Para ver a paisagem não pode deixar de levar os óculos senão, nada vê.

Resolvo ficar de pé para economizar os ossos da bunda e logo passa um idiota e diz:
- "O senhor está muito na beira, pode ter uma tontura e cair."
Resmungo entre dentes: ... "só se cair em cima da sua mãe"... mas, dou um risinho e digo que está tudo bem.

Esta titica deste sol está demorando a descer, então eu é que vou descer, meus pés já estão doendo e nada do por do sol.

Vou pensando - enquanto desço e o sol não - "Volto de metrô, é mais rápido..."
Já no metrô, me encaminho para a roleta dos idosos, e lá está um puto de um guarda que fez curso, sei lá em que faculdade, que tem um olho crítico de consegue saber a idade de todo mundo.

Olha sério para mim, segura a roleta e diz:
- "O senhor não tem 65 anos, tem que pagar a passagem."
A esta altura do campeonato eu já me sinto com 90, mas quando ele me reconhece mais moço, me irrompe um fio de alegria e vou todo serelepe comprar o ingresso.

Com os pés doendo fico em pé, já nem lembro do sol, se baixou ou não, dane-se. Só quero chegar em casa e tirar os sapatos...

Lá estou eu mergulhado em meus profundos pensamentos, quando uma ligeira dor de barriga se aconchega... Durante o trajeto não fui suficientemente rápido para sentar nos lugares que esvaziavam...

Desisti... lá pelo centro da cidade, eu me segurando, dei de olhos com uma menina de uns 25 anos que me encarava... Me senti o máximo.

Me aprumei todo, estufei o peito, fiz força no braço para o bíceps crescer e a pelanca ficar mais rígida, fiquei uns 3 dias mais jovem.

Quando já contente, pelo menos com o flerte, ela ameaçou falar alguma coisa, meu coração palpitou.
É agora...
Joguei um olhar 32 (aquele olhar de Zé Bonitinho) ela pegou na minha mão e disse:
- "O senhor não quer sentar? Me parece tão cansado?"

*** ***

*Quem é Ruy Castro?

Ruy Castro é um jornalista e escritor nascido em Caratinga, MG em 27 de fevereiro de 1948
mais informações em wikipédia

sobre Ruy:


Ruy Castro: “Carmen (Miranda) me salvou do câncer




18 de setembro de 2008
Heloisa Seixas

“Sabe qual é a matéria que todos aqui sonhamos fazer e que resume perfeitamente o espírito do Reader’s Digest?”, perguntou um mordaz jornalista americano ao seu jovem colega brasileiro Ruy Castro, editor-executivo de Seleções, que visitava a matriz da revista em Nova York. (Seleções, como se sabe, é a edição brasileira do Digest.) E, antes que Ruy dissesse alguma coisa, ele mesmo respondeu:

“Cancer made me happy (O câncer me tornou feliz)”. Deu uma gargalhada e acrescentou: “Mas é claro que essa matéria nunca poderá ser feita. É irreverente demais”.

Isso foi em 1974 e Ruy não se recorda mais do nome do jornalista americano. Mas lembra-se de também ter rido muito ao ouvi-lo. No Digest, os personagens de todos os artigos e reportagens podem sofrer o diabo e até morrer, mas, no fim, o leitor precisa ser premiado com uma mensagem de otimismo e esperança. Por exemplo, o sujeito teria um câncer – doença muito pior na época do que hoje -, mas deveria deixar uma lição positiva, de coragem e resistência, para quem lesse sua história.

Heloisa Seixas conta em livro a superação do marido contra o câncer (contém um trecho do livro Álbum de retratos – Ruy Castro) 





Nenhum comentário:

Postar um comentário